Ao propor uma "Introdução aos Escritos de Jacques Lacan", não visamos tornar os"Escritos" compreensíveis, numa linguagem pedagógica que concebe a mente do leitor como uma superfície passiva sobre a qual se depositaria o conhecimento da doutrina lacaniana. Nossa "Introdução aos Escritos" pretende ser, antes, uma provocação. Uma provocação que desperte no leitor o desejo de decifrar, nas estrelinhas do que não se compreende, um saber que depende dele, um saber que dele não se separa, um saber que supõe a sua participação.Se os "Escritos", em sua apresentação sóbria, desprovidas de ornamento, dispensam o espetáculo, é porque Lacan já entendia antes de Guy Debord ter formulado isso, que a essência do espetáculo é justamente a exterioridade do leitor passivo, desapossado de si. De sorte que nossa "Introdução aos Escritos" seria uma tentativa de nos curar dessa doença do leitor passivo ao mostrar que não se pode ler diletantemente os "Escritos" como se fosse objeto de uma curiosidade neutra. Em nossa "Introdução" desejaremos mostrar em que sentido o acesso aos "Escritos" supõe a transformação íntima do leitor, que, ao colocar algo de si, alcança a verdade da causa do desejo, normalmente vedada pela compreensão.